Ao se projetar a inserção econômica do Rio Grande do Sul, tende-se a destacar os principais destinos de exportação — Argentina, China e Estados Unidos, não necessariamente nessa ordem — e os principais itens exportados: complexo da soja, carnes (sobretudo suínos e frangos), químicos e tabaco. Ainda que seja desejável ampliar ou manter os fluxos econômicos do Estado para esses países e nesses setores, convém explorar as oportunidades oferecidas pelos mercados com considerável potencial de crescimento econômico para as próximas décadas. Trata-se dos países em desenvolvimento ou emergentes, sobretudo os localizados no sul da Ásia e na África Subsaariana.
Na atualidade, os países emergentes já compõem a maioria dos destinos, em termos de valor, das exportações gaúchas, seguindo a tendência do próprio Brasil, conforme se observa no Gráfico 1. Em 2014, segundo dados divulgados pela Fundação de Economia e Estatística (FEE), somando-se os quatro parceiros do Brasil nos BRICS (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul) com os países latino-americanos, obtém-se mais da metade de todas as exportações do Estado (as proporções são, respectivamente, 27,2% e 23,8%). Ao se acrescentarem outros países emergentes da África, da Ásia e do Oriente Médio, essa proporção certamente se amplia. Os países do núcleo desenvolvido — América do Norte (9,2%), Europa (16,8%) e Japão (1,22%) — permanecem relevantes, mas sua proporção reduziu-se nas últimas duas décadas.
É complicado caracterizar o comércio com os países emergentes de forma geral, uma vez que há diferenças em cada região geográfica analisada. Enquanto o comércio com os países do leste da Ásia (China, Coreia do Sul, Índia e Vietnã) tem apresentado uma pauta amplamente dominada pela soja e por seus derivados, no que tange à África e aos países vizinhos do Brasil, as exportações são mais diversificadas. No comércio com a Argentina, por exemplo, apesar das flutuações e das restrições recentes, destacam-se itens de médio e alto valor agregado, como máquinas agrícolas, automóveis, insumos industriais e produtos químicos. Com os países africanos e do Oriente Médio, destacam-se, além da soja, produtos de outros setores, como o caso de carnes em geral para Angola (cerca de US$ 108 milhões em 2014, ou quase 54% do total exportado para esse país), tabaco para Indonésia (47% da pauta para o País), e arroz para Cuba (45% da pauta), de acordo com dados do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC).
A análise do período recente, no entanto, não deve obscurecer o enorme potencial de intensificação da corrente comercial para parte considerável dos países emergentes. As expectativas de ampliação das fronteiras agrícolas na América Latina e na África, por exemplo, colocam, simultaneamente, oportunidades e desafios para a inserção do Rio Grande do Sul na economia global. Ao mesmo tempo em que os países latino-americanos e africanos competem diretamente na produção e na exportação, como na de soja e milho, a ampliação das atividades agrícolas nessas regiões pode ir ao encontro dos interesses do setor de máquinas e equipamentos do Estado, logrando, oportunamente, a assinatura de negócios significativos com alguns países daquela região. Essa questão é particularmente importante em um contexto de reprimarização da pauta exportadora observada no período recente.
Atualmente, os países africanos e latino-americanos compram 92% das exportações gaúchas de máquinas agrícolas, conforme pode ser observado no Gráfico 2. Esse dado torna-se ainda mais significativo quando se tem em mente que esse índice atingia 72% em 2005. Esse processo acompanha um movimento geral da política comercial brasileira na última década, que enfatizou a inserção econômica em mercados emergentes. No tocante às máquinas agrícolas, essa estratégia permite que o Rio Grande do Sul tenha demanda para os setores industriais que têm enfrentado muitos obstáculos para competir no mercado externo. Isso porque, por excelência, as economias da América Latina e da África, salvo poucas exceções, são marcadas pelo predomínio do setor agrícola, viabilizando a retomada da indústria na pauta de exportações gaúchas.
Na África, Etiópia, Chade, Moçambique e Ruanda estão entre os 10 países que mais cresceram economicamente no século XXI. Esses, diferentemente de Angola e Nigéria, não são ricos em recursos minerais e avançaram em função de seu desenvolvimento agrícola. Dado seu estágio inicial de desenvolvimento, esses países carecem de máquinas para a expansão de sua produção agrícola, o que abre espaço para a economia gaúcha. De fato, em 2013, o Governo brasileiro assinou um acordo para financiar exportações de equipamentos agrícolas para a África através do Programa de Financiamento às Exportações (Proex). Essa medida insere-se no Programa Mais Alimentos Internacional, cujo intuito é fomentar o desenvolvimento da agricultura africana. Por fim, a linha de crédito que o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) oferece para as exportações de produtos não agrícolas também pode ser aproveitada pela indústria gaúcha interessada em exportar para a África.
Ademais, entre os latino-americanos, realçamos Bolívia e Paraguai, cujo Produto Interno Bruto (PIB) vem expandindo-se a passos largos, com base, respectivamente, na ampliação da agricultura familiar e no progresso da cultura da soja. Esse fenômeno já é sentido pela indústria gaúcha, que tem vendido cada vez mais para produtores bolivianos e paraguaios. Neste último caso, frisa-se que a grande presença de brasileiros (muitos dos quais nascidos no Rio Grande do Sul) radicados no Paraguai possibilita o fortalecimento de laços entre a produção rural do País e o setor gaúcho de máquinas agrícolas. Além disso, também é digno de nota o aumento das exportações para a Venezuela, a despeito da aguda crise econômica que assola o País, movimento que muito provavelmente está relacionado ao ingresso de Caracas no Mercado Comum do Sul (Mercosul), uma demanda antiga de grupos industriais brasileiros. Uma exceção a essa regra é representada pela Argentina, cuja política comercial protecionista, intensificada a partir de 2009, provocou redução de pouco mais da metade das vendas entre 2007 e 2013.
A promoção econômica e comercial no plano externo, diferentemente do caso das relações políticas e diplomáticas, não é atribuição exclusiva da esfera federal. Estados e municípios podem – e devem – promover, no estrangeiro, os setores econômicos locais. De fato, na prática internacional, tem sido observada uma intensificação das atividades externas de autoridades subnacionais na economia global, funcionando, na maior parte das vezes, como um complemento aos esforços dos respectivos corpos diplomáticos oficiais, ou como elos entre os últimos e a comunidade empresarial. A construção de laços econômicos do Rio Grande do Sul com países e regiões que historicamente tiveram participação bastante limitada no radar comercial serve aos interesses da sociedade gaúcha e reforça a política externa brasileira voltada à diversificação de parcerias.